O
que podemos fazer para alavancar a educação brasileira?
Para
responder a essa questão, antes temos que elencar os principais problemas que
causaram, nas últimas décadas, a decadência do ensino público no Brasil, que vão
desde a Educação Infantil até a Universidade, não necessariamente nessa ordem.
Na verdade os problemas transpassam de um nível de ensino para outro
simultaneamente, pois: só profissionais bem formados podem oferecer um serviço
de qualidade; e serviços de qualidade só podem ser oferecidos por profissionais
bem formados. Pode parecer uma redundância, mas esse é um ciclo que, no Brasil,
tem girado na direção oposta.
OS PROBLEMAS
Expansão de vagas sem manutenção da qualidade
A
expansão do ensino público, garantida pela Constituição de 88, foi um grande
marco da educação brasileira, pois até então o ensino era privilégio de poucos.
Com a nova constituição, os pobres enfim tiveram o acesso à escola, porém isso
não significou o acesso ao conhecimento.
Desde
a democratização do ensino este vem sofrendo uma queda quase que vertical em
relação à qualidade.
Sem
dúvida o ensino é um direito de todos, mas com qualidade, a simples
oferta de vagas não garante a formação de um povo capaz de exercer plenamente
sua cidadania.
Promoção automática
Os
serviços públicos no Brasil sempre deixam de ser oferecidos da forma ideal
devido aos altos custos (e ainda tem a corrupção, que torna tudo mais oneroso
aos cofres públicos), com a educação isso não é diferente. A democratização do
ensino fez crescer muito o número de alunos nas escolas, com isso cresceram
também os custos, a diversidade de crianças e as dificuldades para ensinar.
Até
que na década de 90, numa tentativa única e
exclusiva de redução do custo gerado por cada aluno aos cofres públicos, o
governo lança uma forma de acabar com o fracasso escolar, a milagrosa progressão
continuada, que na teoria prevê respeito à individualidade de cada aluno,
mas na prática significa promoção automática. É mais ou menos assim: o governo
oferece escola para todos, mas se você tiver alguma dificuldade pelo caminho,
problema seu, vá se arrastando que lá no final do ciclo (geralmente de 4 anos)
você tem um ano para resolver esses problemas.
Imagine
um aluno que apresentada dificuldade no primeiro ano desse ciclo, ele precisará
se arrastar por mais três anos para ter uma chance de se recuperar. Pergunto:
Duzentos dias letivos são suficientes para sanar as dificuldades de
aprendizagem acumuladas por 4 anos? Isso é acabar com o fracasso escolar? Pode
até mascarar o fracasso da escola, mas e o aluno, o ser humano que não tem a
chance de se recuperar no tempo e na série adequados às suas necessidades?
Assim é a progressão continuada: uma forma de iludir alunos, pais e toda a
sociedade em nome de uma economia burra e que “emburrece” o cidadão.
Desvalorização, desmoralização e formação dos professores
Mas
a progressão continuada adotada em muitos estados brasileiros e em inúmeros
municípios não é a única vilã do desastre educacional brasileiro. Durante esse
período além do aluno, os professores também sofreram demasiadamente com as
políticas educacionais brasileiras.
A
desvalorização e desmoralização dos professores acabaram por afastar desta
profissão as mentes brilhantes (salvo raras exceções), fundamentais à prestação
de um serviço de qualidade. Os baixos salários e condições precárias de
trabalho fazem com que bons professores invistam na carreira acadêmica, na
elaboração de teorias, às vezes mirabolantes, sem nunca terem enfrentado uma
sala de aula, a realidade diária de uma escola. Seguindo o curso natural, são
esses acadêmicos, sem nenhuma experiência com a educação básica que lecionam
aos futuros pedagogos. Seguindo um pouco mais, esses pedagogos se deparam com
uma realidade totalmente diferente das teorias que aprendeu na faculdade.
Não,
os problemas ainda não acabaram. Os salários vergonhosos fazem com que os
aspirantes a pedagogos sejam cada vez menos preparados, menos cultos, menos
instruídos. O que tem uma relação direta com a ineficácia do ensino básico. Ou
seja, se o ensino básico fosse bom, formaria profissionais capacitados, não só na
área da educação, mas em todos os campos profissionais.
Outra
questão que atrapalhou, principalmente, a Educação Infantil e o Ensino
Fundamental I foi a extinção da formação de professores em nível médio, o
magistério. O curso em nível médio oferecia uma ênfase muito maior na prática
que nas teorias, que são sim importantes, mas só se atreladas à prática; a
faixa etária dos alunos (15 a 18 anos) favorecia a prática dos estágios, pois
nesta idade a maioria dos estudantes dedica seu tempo exclusivamente aos
estudos. Hoje os cursos de Pedagogia são, em maioria, no período noturno, pois os
alunos, já numa faixa etária que se inicia aos 18 anos, trabalham durante o
dia, o que prejudica a prática dos estágios, quesito essencial para o
sincronismo entre a teoria e a prática.
Elevado número de alunos por turma
Além
da progressão continuada, da desvalorização dos profissionais da educação e da
má formação profissional dos futuros professores, existe outra grande pedra que
aperta o sapato da educação brasileira, o elevado número de alunos nas salas de
aula. Hoje as salas de aula têm em média 35 alunos. Destes, vários com grandes
dificuldades de aprendizagem, de origens variadas, desde a defasagem pedagógica
até sérias patologias. Além disso, há também questões sociais e
comportamentais. Diante desse cenário visivelmente caótico, querem que o
professor resolva tudo. E pior, estes, muitas vezes, se acham na obrigação de
resolver tudo. O que obviamente não acontece; e se frustram.
Essa
frustração dá origem a uma série de transtornos que vão se acumulando, causando
sérias consequências emocionais, psicológicas e até mesmo patológicas, como a síndrome
de burnout, por exemplo. Essas “doenças” geram outro grave problema para a
manutenção da qualidade da aprendizagem, as faltas excessivas de professores.
Falta de respaldo de profissionais de outras áreas para atuarem na educação, auxiliando o professor nas questões que fogem da alçada pedagógica.
Como
já mencionado anteriormente, a democratização do ensino trouxe para a escola
uma grande diversidade em relação aos alunos e às dificuldades de aprendizagem.
No entanto, muitas destas dificuldades estão fora do campo de atuação do
professor, pois não envolvem apenas questões pedagógicas, mas também
patológicas, fonoaudiológicas, psicológicas, comportamentais e sociais. Esses
atendimentos até são oferecidos, mas de forma precária, incapaz de suprir toda
a demanda.
Estagnação tecnológica
Mais
um e não menos preocupante dos problemas que envolvem o sistema educacional
brasileiro é a estagnação tecnológica das escolas públicas. Apesar de haverem
programas do governo que tentam levar o mínimo de tecnologia para as unidades
escolares, quando essas chegam às escolas, além de já estarem ultrapassadas, ainda
enfrentam, mais uma vez, a falta de formação dos professores, que muitas vezes
não estão preparados para utilizá-las em favor do ensino.
Salvo
raras exceções, as escolas, ainda hoje, têm como principal material pedagógico
a lousa e o giz, como há 50 anos. Compare uma agência bancária de 50 anos atrás
com uma atual, as mudanças são gigantescas. Agora imagine uma escola de 50 anos
atrás e uma atual, as mudanças existem, mas são muito sutis. Acontece que os
alunos de hoje mudaram tanto quanto as agências bancárias.
Conclusão
- Expansão de vagas sem
manutenção da qualidade;
- Promoção automática;
- Desvalorização e
desmoralização do professor;
- Falta de condições adequadas
de trabalho;
- Formação dos professores;
- Elevado número de alunos por
turma;
- Falta de respaldo de
profissionais de outras áreas para atuarem na educação, auxiliando o
professor nas questões que fogem da alçada pedagógica;
- Estagnação tecnológica.
Agora
vem a parte complicada, depois de décadas de decadência o que fazer para
reverter essa situação?
Para
começar é impossível recuperar o tempo perdido, os alunos que passaram e estão
passando por esse ensino decadente, sofrerão, para sempre, as conseqüências; e
a sociedade também.
Em
minha opinião o que deve ser pensado, é como fazer a educação voltar a crescer
daqui para frente.
A
manutenção da qualidade do ensino para todos está intimamente ligada à formação
de bons profissionais; para atrair bons profissionais é preciso valorizar e
oferecer condições adequadas para que estes possam desempenhar seu trabalho.
Parece simples, mas não é. Tudo isso forma uma rede de fatores que para serem
implantados precisam de algumas condições que (também por culpa da falta de um
bom ensino) passam por mãos pouco interessadas em mudar essa realidade, são
elas: vontade política, planejamento e investimento.
Algumas
melhoras têm sido vistas em algumas regiões, mas elas estão longe de serem
mérito das políticas públicas, são sim mérito da consciência de muitos
profissionais que dedicam sua vida a melhorar, através do conhecimento e da
cultura, a vida de muitos cidadãos.
Acontece
que esses profissionais estão sendo extintos. Não só esses, os professores, de
forma geral (os bons e os ruins) estão em extinção, a ponto de o governo lançar
campanhas publicitárias e facilitar a oferta de vagas para as graduações em
licenciatura, como por exemplo: abrir mão de fiador para os estudantes do curso
de licenciatura junto ao FIES. Mas o salário... oh!
Muitos
dirão que estou sendo radical, tendenciosa, etc... Mas estou apenas relatando a
triste realidade nua e crua, como deve ser. Impossível traçar metas realmente
alcançáveis sem despir todos os problemas para enfrentá-los de frente e
resolvê-los definitivamente.
As
questões que me vêm diante deste relato são: Há interesse político em oferecer
às massas uma vasta gama de conhecimento, para que tenham as armas necessárias
para exercerem, de forma plena, sua cidadania??? Ou será mais cômodo oferecer
“bolsa esmola” e manter a população dependente dessa politicazinha
assistencialista???
Essas
perguntas não estão direcionadas apenas aos políticos que receberam da massa o
poder de decidir o que é melhor para o povo, mas também aos cidadãos que
delegaram o poder. O povo quer ter acesso a essas armas e mudar a história, ou
quer continuar dependendo do assistencialismo político do governo???
As
respostas a essas perguntas serão o norte para o inicio do processo de
revitalização da educação brasileira.
[1] A cada um desses
itens cabe um estudo mais detalhado, pois são distintos e envolvem inúmeros subitens.
O breve relato que segue é de forma generalizada.